Em um evento realizado no Centro de Eventos do Ceará, em Fortaleza, o Partido Liberal (PL) reuniu jovens influenciadores, ativistas de direita, parlamentares e profissionais de marketing para algo que, à primeira vista, se apresentou como um seminário de comunicação política. Mas o que se viu foi, na verdade, a consolidação de uma estrutura estratégica de guerra digital para 2026 — agora organizada, técnica e declaradamente apoiada por grandes corporações da tecnologia.
Mais do que discursos ideológicos, o evento mostrou o novo rosto da extrema direita brasileira: não mais baseada apenas em improvisos e memes, mas em um aparato digital profissional, automatizado e turbinado por inteligência artificial. O PL foi apenas a vitrine. No palco e no conteúdo, quem ditou o tom foram executivos e técnicos de plataformas como Google, Meta e CapCut.
Treinamento para a guerra digital
Representantes dessas empresas dominaram a programação. Enquanto parlamentares tiveram falas breves e protocolares, nomes ligados às big techs ocuparam o palco com tempo, protagonismo e poder. Foram apresentados tutoriais sobre como automatizar vídeos, manipular algoritmos, produzir conteúdos com voz sintética, gerar podcasts inteiros com inteligência artificial e impulsionar campanhas no WhatsApp Business — tudo isso com o claro foco na mobilização política e ataque a opositores.
A palavra “regulação” não apareceu. Nenhuma preocupação com desinformação. O objetivo era outro: ensinar como dominar o ambiente digital, emocional e informacional das redes sociais em favor de um projeto político autoritário e antidemocrático.
Um partido digitalizado, uma plataforma instrumentalizada
A inversão é evidente: não é o PL que usa as plataformas, são as plataformas que instrumentalizam o PL. O partido serve de estrutura formal para um projeto que é, na essência, algorítmico e global. Um projeto que pretende colonizar o imaginário social por meio de narrativas fabricadas, impulsionadas e repetidas com precisão tecnológica.
Jair Bolsonaro esteve no evento, mas com papel simbólico: um mascote político que reforça a ideologia e oferece o verniz de “liberdade de expressão”, enquanto os bastidores montam o verdadeiro exército — não de militantes de rua, mas de bots, influenciadores treinados, editores de IA e scripts automatizados. Michelle Bolsonaro foi ausente fisicamente, mas presente como símbolo: uma figura moralizante e disciplinadora, cada vez mais cogitada como rosto de uma nova candidatura.
A falsa liberdade como escudo da violência digital
Durante o evento, o discurso sobre “liberdade de expressão” foi repetido à exaustão — mas não como valor democrático, e sim como licença para atacar, desinformar e manipular sem freios. Vídeos apresentados mostravam o STF como inimigo, Lula e Janja como censores em aliança com a China, e influenciadores como heróis da “liberdade”. A distopia foi travestida de resistência.
Um alerta para a democracia
O que se viu em Fortaleza não é apenas um evento político. É a certificação de uma nova fase na articulação da extrema direita: profissionalizada, tecnicamente estruturada, com respaldo de multinacionais da tecnologia e foco total nas eleições de 2026. Trata-se de uma ameaça real à integridade do debate público, ao processo democrático e à soberania cognitiva do povo brasileiro.
Enquanto setores democráticos ainda discutem princípios, adversários já montam fábricas de conteúdo, treinam seus quadros digitais e avançam algoritmicamente sobre a opinião pública.
Estamos preparados para enfrentar isso?
O PL e seus aliados digitais estão prontos. Eles têm equipe, técnica, narrativa e apoio de estruturas globais. Mas e nós? Vamos seguir ignorando a gravidade da manipulação digital em curso? Ou vamos responder com inteligência, coragem e defesa intransigente da democracia?
*Fonte: Sara Goes – Brasil 247